Ferimentos abertos no tórax: o que devo fazer?
Texto originalmente publicado por Carlos Felipe dos Santos em 12/mai/23.
Disponível em https://medium.com/p/e995285e4255
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Algumas emergências representam um verdadeiro desafio em primeiros socorros. Uma delas são as lesões abertas no tórax, as quais criam o que chamamos de “ferimento aspirante”.
Evidenciado pela presença de bolhas ao redor das bordas, esse ferimento pode causar, rapidamente, complicações indesejáveis que podem levar a vítima ao óbito. O manejo nem sempre é fácil e, ao consultar algumas diretrizes, o prestador do primeiro cuidado pode acabar se deparando com orientações diferentes e, por isso, vamos discutir qual a melhor opção.
Conhecendo o pulmão
Os pulmões são órgãos em formato similar ao de uma bexiga e têm como função receber o ar inalado pelas vias aéreas e oxigenar o sangue, o qual irá transportar as moléculas de oxigênio para todas as células do corpo, permitindo que estas produzam energia. São revestidos por duas finas películas: a pleura visceral e a pleura parietal, sendo que há uma pequena quantidade de líquido entre elas.
Estas estruturas estão dentro do tórax, uma caixa formada por pares de costelas e músculos que conferem proteção e auxiliam na expansão e retração dos mesmos, permitindo o seu enchimento e esvaziamento. Na base dos pulmões, está o diafragma, músculo que auxilia na criação da pressão negativa, a qual produz a expansão dos pulmões. E entre eles, está o coração.
Pulmões e estruturas adjacentes. Reprodução PHTLS/9ª edição.
Quando há uma lesão penetrante no tórax, as pleuras podem ser atingidas e perfuradas. Neste caso, quando a vítima inspirar, a pressão negativa criada pelo diafragma fará com que o ar fora da caixa torácica entre por este orifício e se acumule entre as pleuras, ocorrendo o que chamamos de pneumotórax aberto.
A vítima apresentará dificuldade respiratória e, com o passar do tempo, complicações vão se desenvolvendo, levando a um desequilíbrio nas funções vitais. Se um curativo adequado não for instalado, ainda mais ar se acumulará e este, então, evoluirá para um pneumotórax hipertensivo: o pulmão ficará colapsado e será deslocado, comprimindo outras estruturas, como o coração, podendo causar até mesmo parada cardíaca, já que este não conseguirá mais circular o sangue.
Pneumotórax hipertensivo. Reprodução PHTLS/9º edição.
Selos de tórax
Selos de tórax são curativos desenvolvidos para uso em lesões abertas no tórax para evitar o desenvolvimento de pneumotórax hipertensivo ou mesmo o seu alívio. Possuem uma válvula unidirecional no centro, permitindo a saída de ar e fluídos — e impedir a sua entrada. Possuem excelente aderência, mesmo que em condições adversas, como calor ou frio extremos, suor, sangue, pelos etc.
Veja abaixo uma demonstração de um curativo do tipo, o SAM Chest Seal, desenvolvido pela SAM Medical:
Aplicação do selo de tórax SAM Chest Seal, da SAM Medical.
Curativo de três pontas
Dado o alto custo para aquisição de um selo de tórax comercial, uma alternativa a este pode ser a improvisação com um curativo de três pontas. Para tal, o prestador do primeiro cuidado deve ocluir a ferida com um plástico, que pode ser o da própria embalagem da gaze e, na sequência, fixar três lados com esparadrapo, deixando o lado que está voltado para o chão sem fita, o que permitira a saída de ar e fluídos.
Veja uma demonstração:
Curativo de três pontas. Gentilmente cedido por Washington Freitas.
O que dizem as diretrizes de primeiros socorros
Ao consultar diferentes diretrizes de primeiros socorros, é possível encontrar orientações distintas.
A American Heart Association, por exemplo, não orienta o prestador do primeiro cuidado a usar selos de tórax ou mesmo improvisar curativos de três pontas. A preocupação é que, se colocado de maneira incorreta (ferida completamente selada), a lesão se complique ainda mais, já que o ar acumulado não terá por onde sair.
Por outro lado, o manual de primeiros socorros do National Safety Council ou mesmo o da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho indicam a adoção de um curativo de três pontas ou uso de curativos valvulados para evitar a entrada de mais ar e a progressão para um pneumotórax hipertensivo.
Diante desse dilema, o que deve ser feito?
Primeiros socorros são procedimentos simples, claros e objetivos. A ideia é que qualquer pessoa, com pouco ou mesmo nenhum treinamento, possa executar ações de primeiro cuidado de forma segura e eficaz para aumentar as chances de sobrevivência de uma vítima de agravo ou lesão.
Alguns procedimentos, como o uso de curativos valvulados ou improvisação com curativo de três pontas podem salvar vidas, mas requerem um maior nível de habilidade prática. Nesse caso, as chances de erro também são maiores. Por isso, é comum que algumas diretrizes não orientem você a fazer algum procedimento deste tipo em uma lesão aberta no tórax.
Por outro lado, se você já frequentou um treinamento presencial de primeiros socorros, desenvolveu as habilidades necessárias e tem um curativo comercial disponível ou mesmo meios para improvisação, terá maiores chances de acerto na aplicação do mesmo e, por isso, deve executá-lo para evitar a piora do quadro.
Então, já sabe: se você tem a prática desejada, aça. Do contrário, monitore e aguarde o serviço de emergência.