Como posicionar o torniquete de extremidades: alto e apertado ou 5-7 cm acima da lesão?
Texto originalmente publicado por Carlos Felipe dos Santos em 08/ago/23.
Disponível em https://medium.com/p/340aab849fc3
Tempo de leitura: 4 min.
Durante a pandemia de Covid-19 o tema controle de hemorragias ficou em evidência no Brasil, uma vez que o isolamento social imposto pelo novo coronavírus proporcionou diversos eventos online que permitiram a divulgação das ações educativas sobre, além da atualização profissional em diversas frentes.
No início de 2023, dado os ataques violentos ocorridos em escolas no país, o tema voltou a ser debatido e, agora, uma dúvida tem sido muito recorrente — e motivo de discussões acaloradas: qual deve ser o posicionamento do torniquete de extremidades? Alto e apertado ou cerca de 5–7cm acima da lesão?
Como o torniquete de extremidades deve ser posicionado? Imagem por sasacvetkovic33
Ambas as recomendações encontram suporte na literatura, cada qual com suas particularidades. Então, seja qual for a sua escolha, você não estará cometendo um erro ou mesmo provocando dano à vítima.
Sabendo, então, que existem estas duas opções, qual deve ser a sua escolha, em um cenário de primeiros socorros?
Eu, particularmente, recomendo que o torniquete seja posicionado alto e apertado. Essa indicação foi baseada em três importantes pontos:
1 — Simplificar procedimentos
Quando falamos de primeiros socorros, temos de lembrar que estes procedimentos são caracterizados por serem simples, claros e objetivos. Isso se deve, pois, os tornando mais fáceis de serem executados, o prestador do primeiro cuidado — que pode ser um espectador (pessoa sem treinamento prévio) ou um leigo treinado, se sentirá encorajado e mais confortável em socorrer uma vítima, o que é primordial quando falamos em controle de hemorragias, visto que em poucos minutos ela pode morrer por exsanguinação;
2 — Diminuir as chances de erro
Simplificar os procedimentos de primeiros socorros faz com que o nível de habilidade requerido para executar uma determinada tarefa seja bem menor. Isso é importante pois, ao decidir por usar um torniquete de extremidades, o prestador do primeiro cuidado deve se lembrar que ele não deve ser posicionado com a fita folgada, não deve ficar em cima de uma articulação, tampouco abaixo do ponto da lesão. Essas orientações parecem óbvias, mas diversos estudos já identificaram que, passado um tempo do treinamento inicial, os alunos não se atentaram a esses detalhes ou simplesmente não se lembravam de como usar um torniquete de extremidades. Logo, quanto menos pontos de tomada de decisão ou itens a serem lembrados, maiores as chances de uma boa execução;
3 — Condições ambientais
A depender do local em que a vítima esteja, o prestador do primeiro cuidado pode não ter condições ideais para avaliar um membro, como baixa luminosidade, excesso de roupas com com coloração escura, entre outros fatores, ou mesmo estar em um ambiente em que a ameaça ainda está presente, como em um tiroteio, por exemplo. A vítima pode ter mais de uma lesão e, com o torniquete posicionado abaixo de uma lesão que não foi previamente identificada, a hemorragia não será controlada.
Condições ambientais podem interferir na correta avaliação de um membro que está sangrando. Imagem por simonkr.
Duas preocupações fazem com que a preferência pelo posicionamento alto e apertado não seja a escolha: insucesso no controle do sangramento ou perda da viabilidade do membro.
É fato que, a depender das características físicas da vítima, o prestador do primeiro cuidado tenha dificuldade em controlar um sangramento posicionando o torniquete na raiz do membro, mesmo que ela tenha tracionado bem a fita e girado a barra de torsão o suficiente para tal, como no caso das pernas. Mas, para os casos em que o sangue ainda continua fluindo em direção à lesão, há a previsão, nas diretrizes de controle de hemorragias, da fixação de um segundo torniquete logo abaixo do primeiro para que o fluxo seja devidamente interrompido.
Já em relação à viabilidade do membro, já está bem consolidado que há uma janela de segurança de 2 horas para que o torniquete permaneça fixado. E, tratando-se de um ambiente urbano, dificilmente a vítima receberá atendimento médico em tempo superior à este. Ela até pode não ser conduzida, de imediato, à um hospital de nível terciário mas, ainda assim, será encaminhada para uma Unidade de Pronto Atendimento ou Pronto Socorro, sendo avaliada por um médico em pouco tempo.
Por fim, deve-se ressaltar que a equipe de emergência, ao chegar no local da ocorrência, fará, com base em seu treinamento e respaldada por protocolos institucionais, uma reavaliação do curativo, podendo optar manter o torniquete, reposicioná-lo ou mesmo fazer a conversão para um preenchimento de feridas.
Então, lembre-se do ditado “menos é mais” e saiba que, quanto mais simples, melhor. Escolher posicionar o torniquete de extremidades alto e apertado não é um erro!